Se o tema é o Ostensório de Clara, porque o Ostensório não aparece no relato? O fato aconteceu em 1240 e os Ostensórios surgem na Igreja a partir de 1264, ainda no século XIII. Originalmente, as hóstias consagradas eram colocadas numa Caixa como um Cofre onde se guarda o tesouro mais valioso. No dia 11 de agosto de 1264, o Papa Urbano IV, institui a Festa de Corpus Christi, e é a partir daí que surge o Ostensório para levar em procissão o Corpo do Senhor, e ser colocado no Altar. Ostensório vem do verbo latino ostendere que significa expor, mostrar, ostentar diante dos olhos. A função primordial do Ostensório é apresentar aos fiéis o Corpo de Cristo para a adoração pública. Ele protege o Dogma da Transubstanciação, o dogma perene da Eucaristia, a presencialidade do real do Senhor em corpo e sangue no meio de nós. Ele é adoração e louvor para ser contemplado e não para ser tocado. Quando os sarracenos entram em São Damião não existia, como escrevi acima, o Ostensório, que vai surgir somente 24 anos depois. Clara morreu em 1253 e é canonizada em 1255. A partir de então, a sua imagem vem com o Ostensório nas mãos.
Mesmo que seja o Ostensório e não a Caixa original, o significado é o mesmo: o Tesouro aí guardado é de um valor incomensurável. É a maior riqueza que se pode ter. O Amor pleno ao Esposo e a certeza de que vai ser protegida por Ele é um dos milagres mais expressivos intermediados por Clara. Diz Marco Bartoli: “A luta de Clara foi desarmada, como desarmada tinha sido a batalha de Francisco em Damieta. O Poverello havia se apresentado ao Sultão sem defesa alguma. Clara se posta diante dos sarracenos armada somente do Santíssimo Sacramento. Sua força estava totalmente em sua intercessão e através de tal intercessão, não somente São Damião, mas toda a cidade foi salva (…) Na iconografia posterior à morte de Clara, o vínculo entre Clara como santa poderosa e o Santíssimo Sacramento é ainda mais acentuado: os sarracenos aparecem como cegados e depois postos em fuga pelo brilho que emana da hóstia (…) Clara é considerada campeã da fé que, como os primeiros mártires e também cruzados, enfrenta os inimigo de Deus sequiosos do sangue cristão. Ela é representada antes de tudo como defensor civitatis, aquela que defende a cidade. O milagre parece ser como que um fruto de uma tratativa entre Clara e Deus, ao termo do qual Clara consegue, antes de tudo, a salvação de suas sorores e depois também a garantia da salvação de sua cidade. Esta tratativa, durante a qual Clara falou em nome de toda civitas, desembocou num duplo compromisso: da parte de Deus “A cidade sofrerá muitos perigos, mas será defendida” e da parte de das sorores e dos habitantes de Assis: “Enquanto estiverem dispostos a obedecer os mandamentos de Deus” (Marco Bartoli, Clara de Assis, CFFB-Vozes, 1998, p. 185-186).
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Fonte blog FREI VITORIO MAZZUCO